Biografia e foto: Wikipedia
AURÉLIO PORTO
Afonso Aurélio Porto (Cachoeira do Sul, Rio Grande do Sul,
25 de janeiro de 1879 — Rio de Janeiro, 10 de outubro de 1945) foi um político, poeta, jornalista e historiador brasileiro.
Começou sua vida publicando poesias em O Atleta, em Porto Alegre. Mudando-se para Quaraí, publicou em A Fronteira de 1901 a 1905.
Funcionário público, trabalhou na secretaria da Fazenda do Estado e no Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul, mais tarde no Arquivo Nacional e no arquivo do Itamaraty, onde foi redator dos Anais do Itamarati.[1] Foi eleito intendente de Montenegro.
Foi jornalista também de A Federação de 1925 a 1930; do Diário de Notícias, de 1927 a 1928; e do Jornal da Manhã, entre outros.
Especializou-se na história do Rio Grande do Sul; escreveu O Trabalho Alemão no Rio Grande do Sul, editado por Estabelecimento Gráfico Santa Teresinha, em 1934, além de diversos artigos publicados na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul.
HADAD, Jamil Almansur, org. História poética do Brasil. Seleção e introdução de Jamil Almansur Hadad. Linóleos de Livrio Abramo, Manuel Martins e Claudio Abramo. São Paulo: Editorial Letras Brasileiras Ltda, 1943. 443 p. ilus. p&b “História do Brasil narrada pelos poetas.
HISTORIA DO BRASIL – POEMAS
FARRAPOS
(fragmento)
E vibra pelo ar,, pela coxilhas, pelas
canhadas e sangões, o grito heroico e forte
da farroupilha audaz desafiando a morte.
E Manduca Carvalho a frente e Sezefredo
e Policarpo, aos quais não intimida o medo,
cavalgando no ocaso, espadas cintilantes
a brilhar ao fulgor das últimas centelhas
de luz do sol que morre entre nuvens vermelhas,
galgam, à disparada, o espaço que os separa
da força dos legais, audácia estranha e rara,
mas comum ao valor que n´alma lhes assiste.
Empenha-se o combate. O Pampa, verde e triste,
vibra. O eco repete, à beira das quebradas,
o contínuo estrugir das armas disparadas
pela força imperial contra os três bravos.
Passa,
entre nuvens de pó e nuvens de fumaça,
a força legalista, e os três heróis, somente,
a lutar contra trinta! Assim a nossa gente
era e será, talvez, ainda um dia, quando
pelos pagos azuis da Pátria, alto, vibrando
um clarim nos chamar, que o povo rio-grandense
muito mais que ao Rio Grande à sua Pátria pertence.
Quase dez anos já de louca heroicidade,
num constante lutar em prol da liberdade,
o pendão tricolor, arvorado nas lanças
dos gaúchos, tremula, alimenta esperanças
que não morrem, enquanto, um brado erguido, a espada
possa suster ainda e, em veloz disparada,
fazendo rebrilhar a prata dos apêros,
como um raio cair no horror dos entreveros.
Chegam, enfim, à Estância. Aberta, par a par,
transpõe os três heróis a porta desse lar
tão cheio de bondade e da virtude austera
do velho capitão Fidelis Prates. Era
a Estância do gaúcho, há perto de dez anos,
como um campo neutral onde republicanos
e legais tinham sempre a gentil acolhida
do seu coração d´oiro, embora preferida
lhe fosse, na afeição, a gente assinalada
que fez, de trinta e cinco, a gloriosa cruzada.
Laços de íntimo afeto, o mesmo sangue, antigos
troncos afins, ligava-o a dois desses amigos
que vinham da campanha, onde, em feitos gigantes,
se afirmava o valor das hostes triunfantes
da farroupilha grei. Exulta o velho vendo
em Manduca Carvalho — um gaúcho estupendo!
a bravura de outrora, a inata valentia
dos seus, de Luis Carvalho, um bravo, dia a dia,
combatendo em Missões e nunca, um só momento,
vencido, florescendo, agora, no rebento
que orgulha o velho tronco, o velho herói de outrora.
De pé, evocativo, ouvindo a voz sonora
do Pampa, ao pôr do sol, que nas trevas se abisma
o velho capitão Fidelis Prates cisma.
Entretanto, o bagual do Sezefredo arisco,
toma o freio ao ginete e indômito, num prisco
arranca e como um raio entre as forças legais
cruza e se some atrás do mato. Aos imperiais
opõe os outros dois essa couraça forte
de bravura que afronta impassível a morte.
Nenhuma bala os toca. Extrordinários, guapos
como leões, à frente avançam os farrapos
sobre a força imperial que, indecisa, recua
ante o assombro da audácia. E a luta continua
nas grandes proporções de uma epopeia. Soltas
as rédeas, a correr, as silhuetas envoltas
em fumarada, em pó, somente dos dois Carvalhos,
as espadas na mão, os ponchos em frangalhos
flutuando pelo ar como estranhas bandeiras,
rasgadas no fragor de campanhas guerreiras;
golpe a golpe, a ferir, no entrevero, no embate
das armas, no vai-vem contínuo do combate,
descavalgando aqui, prostrando ali quem tenta
enfrentar-lhes a espada, a descrever, sangrenta,
no ar, curvas da morte, — os dois heróis com glória,
já senhores do campo, assistem a vitória
do feito assinalado.
Um único valente
ataca Policarpo ainda tenazmente.
Este vendo a bravura heroica do guerreiro
exclama-lhe: — És um bravo! Entrega, companheiro
as armas, que o farás com honra.
Então, confiando
no farrapo, o legal abate as armas.
Quando
Sezefredo voltou, sujeitando o bagual
que o afastara dali, da partida imperial
só restava no campo um morto e três feridos.
que os outros a corre, rédea solta, vencidos,
tomados de pavor, já iam bem distante.
E Militão do Canto, o próprio comandante,
para melhor fugir, o cavalo aperado
de prata abandonara e, a custo, num cercado
de espinhos, pôde, assim, varando, se escapar...
A noite, então, descera. Ao clarão do luar,
como um alto relevo em bronze, os farroupilhas,
no largo pedestal do topo das coxilhas,
assumem proporções de centauros gigantes.
E assim entram na História, eretos, triunfantes,
como um glorioso sol, pelo nosso Rio Grande,
alerta sentinela, altiva e sobranceira,
postada nos confins da Pátria Brasileira,
para velar por ela ou por ela morrer
se não puder, um dia, o inimigo vencer.
(A EPOPÈIA DOS FARRAPOS – Livraria Montenegrina,
1922)
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Página publicada em outubro de 2021
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